Palavras ao Vento

Sunday, June 21, 2009

O Projeto Gráfico do Correio do Povo

A primeira edição do jornal Correio do Povo (CP) foi lançada no dia 1º de outubro de 1895, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul (RS). O fundador da Companhia Jornalística Caldas Júnior, Francisco Antônio Vieira Caldas Júnior, construiu um patrimônio de grande relevância histórica regional e até mesmo nacional.

Caldas Júnior faleceu aos 44 anos, em 1913. A empresa, então, passou por diversas dificuldades. Na direção do jornal Correio do Povo estiveram nomes como Emílio Kemp, Leonardo Truda, Fábio Barros, André Carrazoni, entre outros. Em 1935, a direção passou a ser do filho de seu fundador: Breno Alcaraz Caldas, que continuou na presidência por 50 anos. Nas décadas de 40, 50 e 60, Breno Caldas consolidou o CP como líder entre os diários do RS. A Caldas Júnior foi responsável também por outros jornais que tiveram grande importância na sociedade gaúcha como a Folha da Tarde (1936 a 1980) e o matutino Folha Esportiva (1949 a 1963).

Depois de passar por dificuldades financeiras, até mesmo com a interrupção da publicação do jornal em 1984, a Companhia Jornalística Caldas Júnior foi vendida em 1986 para Renato Bastos Ribeiro. A família Ribeiro se manteve no comando da Companhia até 2007, quando foi esta comprada pelo Grupo Record.

Passados 114 anos de publicação diária, tendo apenas o recesso de 2 anos, de 1984 a 1986, o CP continua sendo um dos jornais mais importantes do estado do RS, informando o povo gaúcho com variados assuntos. Caldas Júnior era um homem de um espírito grandioso e tinha muitas pretensões; já no primeiro exemplar publicou no edital:

O Correio do Povo será noticioso, literário e comercial, e ocupar-se-á de todos os assuntos de interesse geral, obedecendo à feição característica dos jornais modernos e só subordinando os seus intuitos às aspirações do bem público e do dever inerente às funções da imprensa livre independente. [...] Este jornal vai ser feito para toda a massa, não para determinados indivíduos de uma facção”.

Assim, surgiu no âmbito de esclarecer de forma imparcial dando espaço a opiniões diversas. Nestor Ericksen, ex-jornalista do Correio do Povo, diz em seu livro O Sesquicentenário da imprensa Rio-Grandense (Livraria Sulina Editora – 1977) que “essa folha (Correio do Povo) se transforma, de imediato (na data de seu lançamento, em 1895) no sereno e equilibrado intérprete das mais puras aspirações rio-grandenses, improvisando-se numa tribuna elevada e imparcial para o debate de todos os problemas sociais, políticos e econômicos do Estado, do País e do Mundo”.

O Correio do Povo é referência na história do surgimento da imprensa independente no RS, pois foi o primeiro jornal do estado gaúcho a declarar não ser ligado a partidos políticos.

O RÓSEO

A primeira edição do Correio do Povo apresentava quatro páginas, sendo distribuídos 2 mil exemplares. Pouco mais de três anos depois, já a tiragem era cerca de 4,5 mil exemplares. Desde então, o CP passou a ostentar no cabeçalho uma caixa com o sloganO jornal de maior circulação e tiragem do Rio Grande do Sul”.

Tratando de sua aparência visual, há um fato curioso na história dessa publicação: ela era conhecida popularmente como “O róseo”, por ter sido impressa, nas primeiras décadas de existência, em grandes folhas rosadas; grandes porque CP foi um jornal de tamanho Standard até 1987. Em 1895, o CP apresentava uma página dividida em seis colunas separadas por linhas que ocupavam o comprimento de toda a página. A sua grande massa era formada pelo texto em si. As notas eram divididas apenas por linhas curtas entre o fim de uma e o começo de outra, não apresentando uniformidade quanto a quantidade de texto.

Destaque para o cabeçalho logo abaixo do título “CORREIO DO POVO” (em letras maiúsculas), utilizado na primeira década: organizado basicamente em cinco colunas separadas por linhas, caixas maiores ou menores eram formadas onde apareciam informações como: ano, a expressão “Jornal da Manhã”, endereço, “Proprietário e diretor Caldas Júnior” (esta caixa em destaque), a data e o valor das assinaturas.

Na primeira década do século XX, a grade do jornal muda o número de colunas: de 6 passam a ser 7 de mesma largura, ainda ocupando todo o comprimento da página, exceto pelo espaço superior, o topo, onde se localizavam os títulos de matérias. Quando eram classificados ou notas, o número de colunas poderia variar para menos, tornando uma ou duas colunas mais largas do que as outras. Apesar disso, não são apresentadas grandes modificações no aspecto visual. A presença ilustrações, como charges, ainda é tímida, podendo ser vista em algumas páginas.

No ano de 1911, pode-se destacar a mudança de diagramação na capa do CP. A organização da capa em caixas de texto de diferentes tamanhos, com respectivas diferenças de fontes cria uma idéia de hierarquização de informações, anteriormente inexistente.

O cabeçalho também muda, passado a ser apenas de uma linha, contendo as informações principais: ano, gerente da empresa, Proprietário e diretor Caldas Júnior, número do exemplar e data. Um quadro com o valor das assinaturas passa para o lado direito do título do jornal; ao lado esquerdo podem ser encontradas as informações do nome do estado, a cidade e o valor do exemplar avulso.

OS EFEITOS GRÁFICOS

DAS ILUSTRAÇÕES ÀS FOTOGRAFIAS

Ao fim da primeira metade do século XX, pode-se observar a inclusão de fotografias no jornal. A Companhia Jornalística Caldas Júnior investiu em tecnologia, tendo quatro impressoras num período de quinze anos, fato revolucionário para a época.

Das ilustrações às fotografias, as imagens foram conquistando cada vez mais espaço na diagramação do CP. As páginas antes uniformes, com uma grande massa de texto, passam a ser substituídas por páginas mais dinâmicas, combinando palavras com fotografias, desenhos, e até mapas.

EFEITOS TIPOGRÁFICOS

Nota-se que a publicação da Companhia Jornalística Caldas Júnior tinha a pretensão de ser inovadora. O CP usou de efeitos tipográficos diversas vezes para destacar um caderno especial, ou uma matéria de grande importância. Como na seção “Correio Infantil”, quando o nome da seção mistura-se com os desenhos lúdicos. Também no caderno Rural, a fonte utilizada para a palavra “rural” se diferencia do resto por ser apenas o contorno fino da letra em preto, criando uma fonte “branca”, ou seja, sem preenchimento. Também o Caderno de Sábado traz um interessante uso dos efeitos tipográficos na capa da edição do dia 3 de janeiro de 1981.

O CADERNO DE SÁBADO

Se estivermos falando sobre o Correio do Povo, não poderíamos deixar de lado o Caderno de Sábado. Este caderno era voltado ao mundo literário. O Caderno de Sábado trazia um rico material literário de escritores gaúchos e nacionais e também artistas plásticos. Este caderno surgiu em 30 de setembro de 1967 e foi mantido até 1981, quando, em 8 de agosto, foi substituído pelo caderno Letras & Livros.

Durante esses quase 14 anos de existência, incentivou a obra de grandes escritores como Mário Quintana, Clarice Lispector, Carlos Nejar, Caio Fernando Abreu, Armindo Trevisan, Moacyr Scliar, entre muitos outros. Mário Quintana manteve sua própria seção publicada dentro do Caderno de Sábado, que foi o Caderno H. Dentre os artistas plásticos que tiveram obras e ilustrações publicadas, destacam-se: Candido Portinari, Francisco Stockinger e Poty Lazzarotto.

Em texto publicado no livro de comemoração ao centenário do Correio do Povo, de 1995, pelo Círculo de Pesquisas Literárias (Editora Nova Dimensão), o professor Elvo Clemente diz que o Correio do Povo nasceu sob o signo da poesia e da literatura sob inspiração lírica e épica do fundador Francisco Caldas Júnior, que “trouxera do norte do país o amor às letras, o amor das artes e a admiração pelas ciências”.

Em entrevista cedida a esta matéria, a ex-funcionária do Instituto Estadual do Livro (IEL) – órgão da Secretaria de Cultura do Estado do RS, criado em 1954 –, Ana Alice Estivalet falou sobre a importância do Caderno de Sábado. O IEL era uma das fontes mais utilizadas pelo Caderno, indicando ao CP autores e obras. Segundo Ana Alice, o Caderno de Sábado foi responsável, juntamente com o IEL, por divulgar a cultura gaúcha e suscitar discussões literárias nacionais sobre os autores gaúchos; a divulgação das obras de Carlos Nejar e Moacyr Scliar motivou a escolha destes escritores para compor a Academia Brasileira de Letras.

Os aspectos visuais deste caderno divergem do resto do jornal. O seu formato era tablóide e apresentava uma diagramação mais arejada, quase sempre trazendo uma ilustração de algum artista que ocupava metade da largura e todo o comprimento da página, tendo em sua outra metade poema ou poesia. As colunas das páginas que preenchiam o caderno, normalmente três, eram mais largas do que as do jornal e tinham um espaçamento maior entre uma e outra, por vezes separadas por linhas. Detalhe interessante é também o uso do itálico em legendas das imagens, estas legendas acabavam por se tornar pequenos textos adicionais.

Fato muito peculiar: eram utilizados artifícios editoriais característico de obras acadêmicas, como “notas” e “referências bibliográficas” ao final das matérias. Algo que é raríssimo, para não dizer inexistente, nos jornais do século XXI.

O RECESSO DE DOIS ANOS

Em 1984, a Companhia Jornalística Caldas Júnior faliu por dificuldades financeiras. Este fato acarretou o recesso da publicação do CP. Em 1986, a Companhia foi comprada por Renato Bastos Ribeiro, que fundou o Sistema Guaíba – Correio do Povo. Renato Ribeiro manteve o nome da Companhia, saldou todas as dívidas da empresa e se empenhou no projeto de relançamento do CP. O objetivo de Renato Ribeiro foi oferecer ao estado gaúcho um maior acesso à informação e assegurar a pluralidade de opiniões. No primeiro edital da nova fase, foi publicada a frase “O Rio Grande e o Correio do Povo se reencontram hoje”.

A RENOVAÇÃO

O retorno do CP foi marcado por um novo projeto gráfico, em muito parecido com o atual. Dia 26 de março de 1987, ocorre a troca de formato: Renato Ribeiro decide trocar de Standard para Tablóide. Com essa decisão, uma nova grade de diagramação foi desenvolvida, como não poderia deixar de ser, pois o espaço diminuiu de forma relevante. Essa estratégia foi uma decorrência lógica do projeto idealizado por Ribeiro: tornar o CP em um jornal de ampla circulação no estado a um preço acessível. O novo projeto gráfico privilegiou a produção de um jornal de fácil e rápida leitura, com hierarquização das notícias, apresentando de forma sintética as informações mais importantes dos fatos divulgados. Os títulos das notícias são utilizados com apenas a primeira letra maiúscula, sempre em negrito. São sete colunas bases. Em algumas páginas do CP criou-se uma coluna somente para pequenas notas de aproximadamente 15 linhas. Agora, o cabeçalho é mais simples.

É importante citar também que antes de 1984, o CP não tinha um número de páginas definido. Era apresentado em torno de 18 a 24 páginas de corpo principal do jornal mais os cadernos. Essa característica se alterou depois de 1986, quando o número de páginas de segunda a sábado era 16 ou 18 e aos domingos, 20. Este projeto gráfico lançado por Renato Ribeiro foi sendo aprimorado com o passar dos anos.

Na década de 90, o CP adotou a utilização da cor azul, além do tradicional preto, em suas publicações. Foi nesta época também foi adotado em peso o recurso das boxes, ou caixas, de texto para melhor destacar as notícias, delimitando o espaço de uma perante às outras. Outros jornais da época, também utilizavam essas duas cores. A substituição por impressora a cores ocorreu na mesma década. Em 1996, foram compradas quatro impressoras rotativas “Urbanite”, como nova planta industrial e impressão simultânea em cores.

Em 1999, o foi lançado o caderno Folha da Tarde - criando uma alusão ao extinto jornal de mesmo nome – com divulgação da programação cultural. Em 2000, os cadernos de classificados voltaram, atendendo aos freqüentes pedidos do público leitor. Também outros cadernos foram incluídos, como o Vitrine, de publicação aos sábados, foi lançado com o objetivo de aumentar os espaços de assuntos tipicamente femininos, como moda, beleza e decoração. A informatização é um fato marcante na redação do jornal e do projeto gráfico. Todas as fotografias e imagens, agora, são digitalizados, sendo obrigatório o uso de câmeras digitais pelos fotógrafos do jornal.

GRUPO RECORD

Em 2007 a Companhia é vendida ao Grupo Record de Comunicação. No dia 5 de maio de 2008, é lançado o novo projeto gráfico do jornal. As mudanças não foram radicais, mas apenas objetivaram uma modernização da aparência das páginas.

Telmo Flor, diretor de Redação na época da reforma gráfica, afirmou que a idéia era atualizar a diagramação, que se mantinha igual há 20 anos. Assim, era preciso o aumento da hierarquização das matérias e a flexibilização da veiculação da informação. O verde foi adotado como cor predominante do jornal; criou-se um maior espaço para reportagens especiais; a previsão do tempo e as notícias sobre o clima ganharam mais enfoque; as fotografias foram posicionadas de forma mais destacada. Além disso, as colunas diárias passam a ter a foto dos autores, o que cria uma maior identificação do leitor com o colunista. Os cadernos de fim-de-semana, incluindo o Vitrine, ganharam um novo padrão visual.

O Correio do Povo, desde 2008, está investindo na modernização dos computadores, com a compra de novos softwares de edição e de novos equipamentos, tudo isso para facilitar o trabalho diário do jornal.